Frase de Thiago Maciel Frase adicionada por
tamaciel em 05/10/2013
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Areia movediça Era uma areia fina e molhada, uma planície convidativa. Os pés aos poucos foram introduzidos, engolidos, submersos entre aqueles grãos microscópicos, sem resistência alguma. E sendo cobertos, centímetro por centímetro da pele, os tornozelos logo desapareceram no meio daquela massa, que continuava a escalar as canelas que quanto mais se moviam, mais afundavam. O esforço para sair dali era em vão, e aquele corpo era lentamente consumido como se esse fosse seu único propósito, e os joelhos desapareceram, e já não existia força suficiente para qualquer reação, senão aguardar o aniquilamento iminente, que agora já beirava o abdome, os intestinos e seguia consumindo rumo ao tórax. A pressão aumentava a cada segundo dentro daquele sepulcro irrevogável, que quanto mais fazia imergir aquele cadáver, que dava seus últimos respiros, mais fazia emergir a angústia, a tristeza e o arrependimento que já havia destruído a amplidão do seu interior. Queria poder acelerar aquele sofrimento, deslizar para o fundo e terminar naquele instante. Nem o tempo o favorecia. Era a pena que deveria cumprir, segundo trás segundo, vagarosamente. Era sua sina. Os braços abertos, imóveis, rendidos àquela infelicidade pela exaustão, estavam privados do contato extrínseco, e o único que sentia eram as partículas entrando pelos poros, envenenando-os. Se enterrava. A respiração era difícil, asfixiante, e o esforço para mantê-la era descomunal. Os olhos estavam arregalados quando seu pescoço foi soterrado, e por segundos se pôde ver uma lágrima cair e se misturar com a areia, que logo invadiu a boca, os olhos e encheu os pulmões, em um suspiro inconsolável. ”
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Pé - d água Todas as noites, antes de dormir, ele passava horas pensando. Como em um ritual diário, se deitava, se cobria com um lençol consumido pelo tempo, murmurava as mesmas palavras e queixas dos últimos cinquenta anos. Mantinha seus olhos abertos. Eram duas bolitas negras e úmidas, que se misturavam com a escuridão daquele quarto. Se sentia só. Sentia que seus pensamentos e sua imaginação eram a fuga do enlouquecimento que poderia surgir a qualquer momento, ocasionado por aquela angústia constante. A chuva começou a cair. Estava deitado, escutando o barulho. Pouco a pouco surgiam as lembranças da sua juventude, que já estavam quase cobertas de poeira, e esta noite ele pensou: Assim como essa chuva chove, já chovi na vida de muitas pessoas. Entrei na vida de muitas como se tivesse caído do céu, assim, de repente, como quando molha imprevisivelmente. De umas, permaneci por várias estações. De outras desapareci, como uma chuva de verão, que se faz evaporar rapidamente. Lembro-me, também, que já tentei chover para algumas que carregavam guarda-chuvas. Haviam os grandes e os pequenos. Os coloridos e os pretos e brancos. Comecei chovendo aos poucos, e acabei chovendo intensamente, sem perder a serenidade. Eu chovia na vertical e na diagonal. Mas nada adiantava, os guarda-chuvas eram eficazes. Também existiram pessoas que choveram na minha vida. Houve as que caíram como uma garoa que quase não molha, que incomoda. Entretanto, houve as que caíram como um temporal, desses que nos deixam ensopados, às vezes submersos nelas mesmas. Ainda que pudesse cair a mais fina das garoas, não possuo guarda-chuva. Estou seco, e assim esperarei a próxima gota que cairá sobre mim. E finalmente ele dormiu. ”
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Saltimbancos Acrobata, que tanto se equilibra em harmonia Pule desse trapézio que já é pequeno demais Para caberem todos os seus sonhos teatrais E, assim, deixe-se navegar nesse mar de calmaria Você, bailarina, que faz suas piruetas macias Rasgue a roupa apertada para que não lhe prenda Escolha uma sapatilha que o fogo lhe acenda E voe, misture-se com o ar que lhe traz ousadias. Malabarista, você que lança tanta sorte às alturas Pare de alternar em seu rosto a alegria e a tristeza Porque enquanto uma é coragem, a outra é incerteza E um dia, talvez, seus sorrisos serão nossas loucuras. Vá, palhaço, coloque seu nariz e vista sua peruca Sinta por dentro a felicidade que aparenta agora Já que atrás da sua maquiagem o choro lhe devora E esqueça toda essa coisa que mais lhe machuca. Todos vocês, saltimbancos desses grandes picadeiros, Façam de suas vidas espetáculos majestosos Que não faltem gestos audaciosamente amorosos E então permanecerão vivos os artistas verdadeiros. ”
Thiago Maciel